Reproduzo, a seguir, fragmentos do artigo
Seu Ully sobreviveu ao holocausto, mas não à violência do Rio, escrito por Jorge Antonio Barros e publicado em 29 de maio de 2008 em
O Globo Online.
O judeu romeno Ulrich
Rosenzweig, de 85 anos, chegou ao Rio há 60 anos, no pós-guerra, com uma mão na frente e outra atrás. Não tinha família, não tinha ninguém. Nem sabia falar o português. Só ele, sua fé no Deus de Israel e uma resistência à toda prova. Trazia no corpo a marca da Segunda Guerra com a qual conviveu até o fim da vida - um estilhaço de granada numa das pernas, resultado de uma das escaramuças vividas como combatente do Exército vermelho, em cujas fileiras havia ingressado para escapar de um campo de concentração nazista na Ucrânia. Ou era o campo de concentração ou entrar para o Exército russo.

Logo que se estabilizou foi buscar os pais na Ucrânia e uma irmã, Netty Maidantchik, de 66 anos, que à época tinha apenas 12 anos e já era uma das prisoneiras do campo de concentração nazista em Moguilof, na Ucrânia. Quando seu Ully chegou ao Rio, em 1948, a cidade ainda não havia passado por seu grande "boom" de crescimento, pós-êxodo rural. Ele veio em companhia de alguns amigos judeus que estavam em busca de parentes, como Nathan Kimelblat, que depois fundou a joalheria Nathan. Com a profissão de vendedor ambulante ("clintelt", em iídiche, o dialeto judaico), seu Ully vendia jóias de casa em casa, pelo Centro do Rio. Mais tarde trabalhou em tudo um pouco.
Seu Ully, como era conhecido pela família e pela vizinhança do Arpoador - onde morava - era duro na queda, embora seu sobrenome em alemão signifique "galho de rosa". Ele venceu o nazismo, o comunismo, a Segunda Grande Guerra, o medo e a solidão. Só foi derrotado pela violência do Rio de Janeiro. Morreu na tarde de terça-feira passada com um tiro no peito disparado por um assaltante que acabara de roubar R$ 9.800,00 do contínuo da empresa dele.